O guasqueiro e a arte gaúcha do couro no apero crioulo.
Chama-se
"guasqueiro" no Brasil, "guasquero" ou "soguero"
no Uruguai e na Argentina o artesão que usa como principal matéria
prima de seus trabalhos o couro cru, couro vacum sem ser curtido.
A
palavra guasqueiro vem de "guasca" que no dialeto "quechua"
significa pedaço ou tira de couro cru, sendo o guasqueiro,
aquele que faz trançados exclusivamente com este material.
A
origem deste ofício, remonta o período de colonização espanhola e
portuguesa na América do sul, quando o “gaúcho histórico”
começava a se desenhar nos campos do Rio Grande do Sul e dos países
do Prata, caçando o gado selvagem abandonado pelos jesuítas
espanhóis, surgia o trabalho do guasqueiro, que era o de fabricar
artigos de couro para montaria.
Aproveitando
a abundância de couro vacum e cavalar na região, o gaúcho que
vivia sob o lombo de um cavalo, passou a desenvolver suas próprias
técnicas na feitura de utensílios de montaria.
A
partir da cultura eqüestre, herdada de portugueses e espanhóis com
suas raízes Árabes, aliado a arte de marinharia e sem esquecer da
influência indígena, nasce um tipo de trabalho único, dado a
complexidade e diversidade de suas técnicas, assim como o esmero na
busca da beleza estética.
Entre
uma correria de gado e outra, entre uma guerra e outra, os primeiros
gaúchos viviam períodos de ócio, tempo necessário para
desenvolverem intrincados e complexos trançados de couro, destinados
não somente para deter e guiar a sua montaria, mas também embeleza-la,
já que era no cavalo e seus aperos que demonstravam seu orgulho e na
maioria das
vezes sua única fortuna pessoal.
Com
a divisão dos campos em estâncias, o gaúcho tornou-se peão de
campo, e o oficio dos guasqueiros manteve-se vivo em seu dia-dia,
fabricando as ferramentas de trabalho. Não foram poucos os
que se dedicaram exclusivamente à profissão de guasqueiro, e
passaram a fabricar os “preparos ou aperos”, como são chamados o
conjunto de peças necessárias no trabalho a cavalo.
Alguns
destes guasqueiros passaram a receber inúmeras encomendas e
tornaram-se famosos em suas regiões, seja pela resistência e
durabilidade de seus trançados de trabalho, ou pela delicadeza e
refinado gosto nos aperos de luxo, para os dias de festa.
No
séc. XX, o guasqueiro tradicional assim como o próprio gaúcho,
viveu seu período de decadência. Com o fracionamento das estâncias
e a diminuição de suas áreas, reduziu-se também a quantidade de
trabalhadores, o que consequentemente refletiu nos guasqueiros, assim
como também a substituição do couro cru, pela fibra sintética.
Diferente
desta realidade, na Argentina, por questões econômicas e
principalmente por uma retomada do nacionalismo e acima de tudo do
tradicionalismo gaucho, já em fins do séc.XIX, o ofício dos
guasqueiros passaria a ser valorizado como uma identidade regional, e
suas peças começavam a figurar em coleções particulares e museus,
o que lhes deu notoriedade e garantiu a sobrevivência do ofício.
Nos
dias de hoje, a exemplo do país vizinho, o Brasil e principalmente
os rio-grandenses, começam a ver com outros olhos o trabalho do
guasqueiro. Com o crescimento dos criatórios de cavalo crioulo e o
renascimento de um novo tradicionalismo, que busca não somente
autenticidade mas compreender sua essência, o guasqueiro volta a
ativa e com força total, adapta-se a nova realidade e passa a
produzir não somente os preparos tradicionais de trabalho, mas os
que serão usados em pistas de exposições morfológicas, provas
funcionais, bem como objetos decorativos, e de uso urbano
aproveitando-se da antiga técnica.
Texto:
Rodrigo Lobato Schlee
Pelotas,
25/05/2007